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sexta-feira, 17 de julho de 2009

Um parnaso romântico!

Noite de Inverno

Sonho que estás à porta...
Estás - abro-te os braços! - quase morta,
Quase morta de amor e de ansiedade.
De onde ouviste o meu grito, que voava,
E sobre as asas trêmulas levava
As preces da saudade?


Corro à porta... ninguém! Silêncio e treva.
Hirta, na sombra, a Solidão eleva
Os longos braços rígidos, de gelo...
E há pelo corredor ermo e comprido
O suave rumor de teu vestido,
E o perfume subtil de teu cabelo.


Ah! se agora chegasses!
Se eu sentisse bater em minhas faces
A luz celeste que teus olhos banha;
Se este quarto se enchesse de repente
Da melodia, e do dano ardente
Que os passos te acompanha:


Beijos, presos no cárcere da boca,
Sofreando a custo toda a sede louca,
Toda a sede infinita que os devora,
- Beijos de fogo, palpitando, cheios
De gritos, de gemidos e de anseios,
Transbordariam por teu corpo afora...


Rio aceso, banhando
Teu corpo, cada beijo, rutilando,
Se apressaria, acachoado e grosso:
E, cascateando, em pérolas desfeito,
Subiria a colina de teu peito,
Lambendo-te o pescoço...


Estrela humana que do céu desceste!
Desterrada do céu, a luz perdeste
Dos fulvos raios, amplos e serenos;
E na pele morena e perfumada
Guardaste apenas essa cor dourada
Que é a mesma cor de Sírius e de Vênus.


Sob a chuva de fogo
De meus beijos, amor! terias logo
Todo o esplendor do brilho primitivo;
E, eternamente presa entre meus braços,
Bela, protegerias os meus passos,
- Astro formoso e vivo!


Mas... talvez te ofendesse o meu desejo.
E, ao teu contacto gélido, meu beijo
Fosse cair por terra, desprezado.
Embora! que eu ao menos te olharia,
E, presa do respeito, ficaria
Silencioso e imóvel a teu lado.


Fitando o olhar ansioso
No teu, lendo esse livro misterioso,
Eu descortinaria a minha sorte...
Até que ouvisse, desse olhar ao fundo,
Soar, num dobre lúgubre e profundo,
A hora da minha morte!


Longe embora de mim teu pensamento,
Ouvirias aqui, louco e violento,
Bater meu coração em cada canto;
E ouvirias, como uma melopéia,
Longe embora de mim a tua idéia,
A música abafada de meu pranto.


Dormirias, querida...
E eu, guardando-te, bela e adormecida,
Orgulhoso e feliz com o meu tesouro,
Tiraria os meus versos do abandono,
E eles embalariam o teu sono,
Como uma rede de ouro.


Mas não vens! não virás! Silêncio e treva.
Hirta, na sombra, a Solidão eleva
Os longos braços rígidos de gelo;
E há, pelo corredor ermo e comprido,
O suave rumor de teu vestido
E o perfume subtil de teu cabelo...

(Olavo Bilac)

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