Intrínseca
onde a arte tenta começar
quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012
sábado, 5 de novembro de 2011
Música, tecnologia e bananas
Já vai longe o tempo em que a música popular ambicionava, e tinha, uma certa transcendência. Quando marcava e comentava momentos históricos e sociais importantes, era a trilha sonora de um mundo em transformação. Na era digital tudo mudou, a música se banalizou, está em toda parte, a todo momento, acessível a todos.
Hoje, todo mundo pode até fazer música, mesmo sem saber música. Com programas como o Garage Band qualquer um faz uma orquestração com cordas, metais, palhetas e percussões, com incontáveis ritmos e timbres e múltiplas escolhas de fraseados, tudo pré-gravado e programado para se harmonizar entre si. Nada garante que saiam bons arranjos, mas não ficam longe do que se ouve na música comercial de hoje...
No fim do século 20, David Bowie previa que, no futuro, o comércio de música digital seria como a energia elétrica, o gás, e a TV a cabo. O cliente teria uma assinatura e pagaria pelo seu consumo mensal. A música seria uma commodity, vendida a preço de banana. Tantos watts de eletricidade, tantos canais de TV, tantos quilos? Litros? Metros? Bites? de música.
Hoje, além de novos modelos de negócio que florescem em países com a cultura de pagar pelo que se consome, a comercialização globalizada de música, legal e pirata, acabou com o que restava das antigas ilusões de relevância, transcendência e glamour da música popular, que a velha indústria do disco desenvolveu, e sugou, à exaustão. A vulgaridade se tornou um valor indispensável ao sucesso de massa. Em compensação fazer e consumir arte musical se tornou mais fácil e acessível, bastam talento e um laptop. Há gosto para tudo.
Hoje, a música popular, a melhor e a pior, se tornou irreversivelmente banal, como uma banana. O contraponto da 'bananização' da música gravada é a valorização da música ao vivo, quando se cria entre o artista e o público uma relação pessoal e intransferível, muito além do contato virtual.
Há 20 anos, Caetano Veloso falava sobre fazer, ou não, novas músicas e dizia que já havia música demais em toda parte. E eu concordava com ele. Imagine agora.
Mas, afinal, para que serve a música?
NELSON MOTTA - O Estado de S.Paulo
domingo, 24 de abril de 2011
O formato do umbigo
Luis Fernando Verissimo - O Estado de S.Paulo
24 de abril de 2011 | 0h 00
Aquela "pasta" curta e oca que os italianos chamam de "pene" tem este nome porque lembra o pênis, mas não deve ser verdade que a inspiração para o nome veio do pinto pequeno do Davi de Michelangelo. Os mesmos italianos dizem que os "tortellini" têm o formato do umbigo de Vênus, mas este parâmetro, como o pinto do Davi, também não é universal, felizmente. A variedade de umbigos - côncavos, convexos, redondos, alongados, etc. - é, mesmo, uma das coisas que nos diferenciam um dos outros.
***
Muitas coisas nos unem. Somos todos bípedes mamíferos. Todos os nossos antepassados, sem exceção, eram férteis. Todos sobreviveram até no mínimo a puberdade e todos tiveram ao menos uma relação sexual, digamos, convencional, e procriaram. Somos portadores de uma linha ininterrupta de DNAs triunfantes, portanto, e essa ascendência idêntica nos permite não só um sentimento de família como um certo orgulho do que conquistamos como espécie. A Natureza e os germes têm feito o possível para interromper nossa linhagem, mas perseveramos e prevalecemos. Pelo menos até agora.
***
Nossas diferenças estão nos detalhes. Machos e fêmeas, para começar pela diferença mais óbvia. A cor da pele, a diferença mais superficial e sem importância que existe. E detalhes mínimos, como o formato do umbigo. Sabe-se que há muito mais destros do que canhotos no mundo, mas que tipo de umbigo tem a maioria? E que porcentagem lembra um "tortellini"?
***
O umbigo tem causado controvérsias há gerações. Discutiam se nas imagens do Paraíso, Adão e Eva deveriam aparecer com ou sem umbigo, já que não tinham nascido de partos normais e sim feitos por Deus. Uma corrente justificava a presença de umbigos no primeiro casal como uma espécie e "imprimatur" do Criador, um carimbo bem no centro do corpo garantindo o equilíbrio da imagem e a autenticidade da obra. Outros encerravam a questão argumentando que, como Deus tinha criado o Homem à sua imagem, apenas reproduzira em Adão e Eva seu próprio umbigo, e quem ousava especular sobre a origem do umbigo de Deus? Na arte religiosa, os umbigos de Adão e Eva permaneceram. Como símbolo, ao mesmo tempo a marca da nossa ligação vital com o ventre materno e através dele com a nossa ascendência comum, com o cordão metafórico que atravessa os séculos e nos conecta todos ao começo da espécie, e à marca da nossa individualidade.
***
O formato do umbigo é uma das pequenas coisas que determinam se somos minoria ou maioria na nossa própria espécie. Podemos pertencer a categorias dominantes ou a pequenas dissidências, sem nunca saber. Quantos homens botam as mãos na cintura quando fazem xixi? Ou uma mão na cintura enquanto a outra garante a pontaria? Somos multidões ou uma confraria que não se conhece? É mais comum abotoar a camisa de cima para baixo ou de baixo para cima? E comer a casca do queijo? Ou gostar de bife de fígado? Você pode se achar meio esquisito sem suspeitar que a maioria das pessoas tem a mesma esquisitice, ou achar perfeitamente normal mastigar a gravata e não entender a estranheza dos outros. O importante é, minoria ou maioria, nunca perder a consciência de que somos todos descendentes da mesma linhagem, a dos que venceram tudo o que conspirava contra sua reprodução. E temos os umbigos para provar.
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Muitas coisas nos unem. Somos todos bípedes mamíferos. Todos os nossos antepassados, sem exceção, eram férteis. Todos sobreviveram até no mínimo a puberdade e todos tiveram ao menos uma relação sexual, digamos, convencional, e procriaram. Somos portadores de uma linha ininterrupta de DNAs triunfantes, portanto, e essa ascendência idêntica nos permite não só um sentimento de família como um certo orgulho do que conquistamos como espécie. A Natureza e os germes têm feito o possível para interromper nossa linhagem, mas perseveramos e prevalecemos. Pelo menos até agora.
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Nossas diferenças estão nos detalhes. Machos e fêmeas, para começar pela diferença mais óbvia. A cor da pele, a diferença mais superficial e sem importância que existe. E detalhes mínimos, como o formato do umbigo. Sabe-se que há muito mais destros do que canhotos no mundo, mas que tipo de umbigo tem a maioria? E que porcentagem lembra um "tortellini"?
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O umbigo tem causado controvérsias há gerações. Discutiam se nas imagens do Paraíso, Adão e Eva deveriam aparecer com ou sem umbigo, já que não tinham nascido de partos normais e sim feitos por Deus. Uma corrente justificava a presença de umbigos no primeiro casal como uma espécie e "imprimatur" do Criador, um carimbo bem no centro do corpo garantindo o equilíbrio da imagem e a autenticidade da obra. Outros encerravam a questão argumentando que, como Deus tinha criado o Homem à sua imagem, apenas reproduzira em Adão e Eva seu próprio umbigo, e quem ousava especular sobre a origem do umbigo de Deus? Na arte religiosa, os umbigos de Adão e Eva permaneceram. Como símbolo, ao mesmo tempo a marca da nossa ligação vital com o ventre materno e através dele com a nossa ascendência comum, com o cordão metafórico que atravessa os séculos e nos conecta todos ao começo da espécie, e à marca da nossa individualidade.
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O formato do umbigo é uma das pequenas coisas que determinam se somos minoria ou maioria na nossa própria espécie. Podemos pertencer a categorias dominantes ou a pequenas dissidências, sem nunca saber. Quantos homens botam as mãos na cintura quando fazem xixi? Ou uma mão na cintura enquanto a outra garante a pontaria? Somos multidões ou uma confraria que não se conhece? É mais comum abotoar a camisa de cima para baixo ou de baixo para cima? E comer a casca do queijo? Ou gostar de bife de fígado? Você pode se achar meio esquisito sem suspeitar que a maioria das pessoas tem a mesma esquisitice, ou achar perfeitamente normal mastigar a gravata e não entender a estranheza dos outros. O importante é, minoria ou maioria, nunca perder a consciência de que somos todos descendentes da mesma linhagem, a dos que venceram tudo o que conspirava contra sua reprodução. E temos os umbigos para provar.
sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011
O coelhinho da lua
"Haviam 3 coelhos, um rico, um classe média e um muito pobre. Todos eles se diziam apaixonados pela lua. O primeiro coelho convidou a lua para jantar, encomendou as melhores coisas: lagostas, caviar, o melhor champagne... e a lua se fartou com toda a comida! O segundo coelho, enciumado, fez o que pôde: uma bela feijoada, galinhada com os melhores temperos e também convidou a lua para comer em sua casa... O terceiro coelhinho também quis convidar sua amada para comer... entretanto, quando a lua chegou para o jantar só havia um caldeirão de água fervente... Nesse momento, o coelho saltou dentro do caldeirão oferecendo a única coisa que ele poderia dar para alimentá-la: a si mesmo! (pelo visto a lua aceitou a oferta...) E é por isso que quem está apaixonado (como o coelho da história) enxerga o coelho na lua..."
Agora eu sei que não só sou eu que o vejo!
segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011
Uma loucura sã recém-nasceu
Tava na cama lendo Caio Fernando Abreu, atualmente meu escritor predileto, quando me peguei lendo em voz alta um diálogo com cara de pensamento que dizia algo que não sei por que me assustou.
Me peguei com o celular na mão pra te ligar e ler pra você, mas não achei correto (nem oportuno).
Então imaginei como seria ler pra você. Imaginei a cena completa, com direito à todas as sensações - acho que o nome é esse - organolépicas. Imaginei o cenário, cenário esse totalmente possível. Imaginei os atores; dois atores. E nenhum público.
Aí eu voltei ao mundo, às páginas, e a loucura lúcida do meu contista favorito e fui, depois de lhe dizer isso, dormir.
Danielle Urquiza
sexta-feira, 21 de janeiro de 2011
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